A carona

Durante um bom tempo da minha vida profissional, minhas atividades estavam concentradas em Rolante. Então, todos os dias, havia o deslocamento entre a Taquara e a “Capital Nacional da Cuca”.

Em alguns dias, a viagem era familiar, pois eu contava com a presença da esposa Gabriela e do filho Henrique: a mamãe também ia ao trabalho e o Henrique para a escola. Em outras tantas oportunidades, ainda tínhamos o Júlio Zolner como caroneiro, um amigo de longa data que, devido ao trabalho na Polícia Rodoviária Estadual, fazia muitos plantões noturnos e sempre estava no “bico” por uma carona. O Júlio como carona era garantia de conversa agradável, de papo sério, mas também boas risadas.

Além dessas pessoas, muitas vezes quem me acompanhava era um caroneiro virtual, o jornalista Ricardo Boechat, que trabalhava na Band e se revezava entre o rádio e a televisão. Boechat era daquelas pessoas que, caso estivesse presente fisicamente na nossa rotina diária, teria tudo para ser um grande amigo: era ácido e gentil ao mesmo tempo, de opiniões fortes, incisivo, sabia cobrar mas também propor.

Ah, que falta fazem mais pessoas como Boechat. O jornalista partiu precocemente, vitimado em um acidente aéreo. Hoje, muitas de nossas redes são tomadas pelos analistas de Facebook, pelos especialistas de Instagram e pelos comentaristas de Whatsapp. Falta muita coerência, respeito e empatia; sobram discussões sem argumentos, palpites e polêmicas.

Eu sou daquelas pessoas que acredita que estamos sempre prontos para evoluir, ao mesmo tempo que seremos eternamente imperfeitos. Sim, bato na tecla da “melhoria contínua”, tema que extraí dos muitos cursos que fiz ligados a área de qualidade. Entretanto, estar pronto não quer dizer estar disposto. Porque para melhorarmos, é preciso entrega, é preciso disposição, é necessário esforço e planejamento. A velha história, é preciso dar o primeiro passo

É fato que, muitas vezes, acabamos pegando “carona” na apatia, na incerteza, até mesmo na desesperança ou na avaliação alheia (esta nem sempre coerente ou importante).

Sempre que eu ouvia o Boechat falando na rádio estabelecia-se uma sinergia, uma coisa boa, mesmo que o assunto fosse espinhoso. Era a realidade, tal qual como é hoje, com dias bons, outros ruins, mas num eterno ciclo de recomeço.

Hoje minha realidade é diferente, trabalho mais perto de casa, nem o rádio preciso ligar. Mas ando tentando sempre “dar carona” para uma palavra gentil, para um abraço (mesmo que virtual, nestes tempos pandêmicos), para a esperança e para a tentativa de ser melhor e fazer, ao menos para o mundo que “me rodeia”, um espaço um pouco melhor, também.

São tempos “bicudos’, com certeza. Tem dias que é difícil manter o otimismo ou não se deixar envolver por assuntos negativos. Mas digo, escrevo e repito: apesar de tudo, somos resilientes, capazes e criativos, é de nossa natureza.

Quando as condições relacionadas à pandemia permitirem retomarmos ao menos parte de nossa vida normal, que a gente possa convidar a alegria, a felicidade, as velhas e novas amizades, para uma carona. E que esse passeio em “boas companhias” nos leve a novos lugares, a novas experiências e aprendizados, para evoluirmos, sempre.

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